Rachel de Queiroz e o Dia da Literatura Cearense
17 de novembro de 1910 é a data de nascimento
da escritora Rachel de Queiroz. Fosse viva, estaríamos hoje comemorando seu
aniversário, “mais um ano de vida”. Nós, seus leitores, a sociedade estaríamos sim.
A escritora, porém, certamente não veria razões para festejos. O motivo eu lhes
digo.
Em Vida, uma de suas crônicas, Rachel
de Queiroz nos ensina que ninguém deveria comemorar “mais um ano de vida”. Isto
porque todos nós, na verdade, morremos um ano em cada aniversário de nascimento:
“Do primeiro dia ao último, sempre essa
ilusão, esse engano: você pensa que está vivendo - qual! - e todo tempo você
está morrendo. Ninguém vive - todo mundo apenas morre. Acontece que o processo
de morrer é lento, e a esse acabar-se devagarinho é que os homens chamam de
viver”.
A autora não faz floreios ao explicar sua
tese de que nós já começamos a morrer a partir do momento em que chegamos ao
mundo:
“Nasce um menino, por exemplo. Veio roxo
e mudo, é um pequeno defunto maltratado. O médico faz as manipulações
clássicas, cabeça para baixo, palmada, ar no pulmão - o menino dá um grito
agudo e dilacerante e o pai sorri deslumbrado: "Meu filho está vivendo,
começou a viver!" viver nada, seu idiota, seu filho começou foi a morrer. Sim,
desde aquele primeiro instante. Porque vida é um processo negativo, enquanto a
morte é o processo positivo”.
No decorrer da crônica, defende ela a
ideia de que “Viver é andar para trás(...). A gente faz a conta da idade:
quantos anos já viveu? Para que essa conta, senão por um único motivo: para
fazer o cálculo provável do quanto ainda nos resta, antes de morrer. A cada
ano, a cada dia, a cada hora e minuto, você tem menos vida dentro de si(...)”
Viver é morrer
Rachel nos brinda com uma pérola como “viver
é a própria negação da vida”, ou seja, “viver é morrer”.
Mas não se assuste o leitor nem julgue decadentista
a ilustre senhora. Ao declinar sobre essa visão oposta em relação aos anos de
vida, a autora nos alerta sobre alguns dos males que, na ânsia de viver, muitos
acabamos por nutrir e até mesmo repercuti-los.
De nada vale a arrogância, o orgulho. “Nem
o pudor adianta. Esse ciúme de si mesmo”. De nada adianta a ambição. “Você
trabalhando por um lado, a morte trabalhando pelo outro, são como duas cobras
que se mordem pela cauda”.
Em sua maestria na arte de escrever, Rachel
nos faz refletir sobre nosso modo de encarar a vida, sobre o que devemos
valorizar – ou não – durante essa passagem regressiva a que chamamos de vida.
Dia da Literatura Cearense
A data 17 de novembro foi adotada como o
Dia da Literatura Cearense, em homenagem a nossa grande escritora, criadora de inúmeras
personagens e obras marcantes – Memorial de Maria Moura, as três Marias entre
muitas outras.
Rachel de Queiroz iniciou sua produção
literária ainda menina, com o livro O Quinze e escreveu até pouco antes de sua
morte, aos 92 anos.
O blog A vida é crônica dedica
essa homenagem a Rachel de Queiroz e todos os escritores e escritoras
cearenses.
(Rachel de Queiroz, in 100 Crônicas Escolhidas, josé Olimpo
Editora, 3a edição, Rio 1973)
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